sexta-feira, 16 de abril de 2010

Minha história com Daniel

Lendo todos os relatos sobre o Daniel e as homenagens feitas pelos amigos, senti que faltava a minha parte. Resolvi que compartilhar minha história com Daniel, com quem possa se interessar, talvez me ajudasse a superar a tristeza profunda que sinto agora e que me impede de tocar a vida com a mesma fluidez de antes.

Foi no dia 24 de julho de 1996, num fim de show da extinta Mosaico, um domingo a noite, no extinto Tequila Café, que eu passei pelo Fabinho, voltei e falei:  "Oi, você é o cara da Snooze, né?".

Eu estava com a Daniela e o Fabinho, com o Daniel. Nessa noite mesmo, já voltamos pra casa da minha tia no carro com os meninos. Antes, porém, bebemos juntos até o bar nos expulsar e, não satisfeitos, compramos um vinho barato e ficamos falando besteira dentro do carro até de manhã. Por pelo menos um ano, não conseguimos nos desgrudar mais.

Ainda morava em Maceió nessa época. Então começamos uma rotina louca de num fim de semana a gente vinha, no outro eles iam lá. Viramos um quarteto inseparável. Eu ficava com Daniel e a Dani ficava com Fabinho. Só beijinhos. Mas uma regra silenciosa proibia que qualquer um assumisse que estava namorando. O mais importante era a união dos quatro.

Nossa amizade tinha uma pureza muito grande. Não era nada do tipo "sexo, drogas e rock'n'roll", apesar deles serem "os caras daquela banda de rock". A gente gostava mesmo era de falar besteira. Ríamos muito. Nos amávamos intensamente e só queríamos estar juntos. Cada vez que tínhamos que nos despedir era um sofrimento.

Era o início da nossa independência, fase de ouro que tive o privilégio de compartilhar com Daniel, Fabinho e Daniela. Fizemos viagens loucas pra Recife e Salvador, só como desculpa pra passar mais tempo juntos.

Essa em Salvador é antológica. Tocamos o terror num bar, também extinto, que tinha o sugestivo nome de 'Vicious'. O dono era o Messias, na época ainda vocalista da brincando de deus e já amigo dos meninos. Muito foda aquele bar. Aquela noite foi inesquecível.

A de Recife Fabinho não foi - e ficou arrasado por isso. Daniel encarou 8 horas de ônibus só pra passar um fim de semana com a gente, na roubada. Ficamos os três num mesmo quarto de hotel. Levamos uma bronca da recepcionista por isso, mas nem ligamos. Não teve nenhuma orgia. Só enchemos a cara e rimos muito. Muito mesmo. Com todo tipo de bobagem que nos vinha a cabeça. Saímos uma noite, só pra sair mesmo. Fomos num show do Kid Abelha no (também) extinto Circo Maluco Beleza. Mas a gente nem ligou pro show, especialmente depois que Daniel fez um comentário infeliz sobre as pernas da Paula Toller (humpf!). Conversamos, bebemos muito e rimos alto.

Quando eles iam pra Maceió ficavam na minha casa. Eu ainda não sabia dirigir. Numa dessas vezes, Daniel, com aquela cara de bom moço, conseguiu uma façanha inacreditável: dirigir a caravan do meu pai pra gente sair à noite. Quem conhece o meu pai, e a relação dele com o carro DELE, deve estar agora de queixo no chão.

Quando eu e Dani vínhamos pra Aracaju, ficávamos na casa do Fabinho. O pai do Fabinho era representante dos vinhos Santa Felicidade e a loja era na garagem da casa. E mais: os pais dele não passavam o fim de semana em casa. Era o verdadeiro paraíso. Demos uma boa baixa nos estoques de seu Rafael.

Mas, um dia, Daniel conheceu outras meninas. E, do mesmo jeito que eu tinha roubado ele das amigas dele (Alessandra, Ágatha e Gabi - que naturalmente me detestavam) elas roubaram ele de mim. E, óbvio, eu as detestei. Na verdade, isso eu iria entender só muito tempo depois, Daniel é que era assim: desprendido, aventureiro, nômade. Algum tempo depois, ele foi embora morar em Campinas e também deixou essas meninas pra trás. E lá, deixou outras muitas.

Apesar da distância e da eterna queixa por ter sido abandonada, é óbvio que ele sempre teve um lugar especial na minha vida. Principalmente porque foi depois que ele se afastou que eu comecei verdadeiramente minha história de amor com o Fabinho.

Uma década se passou. Crescemos, amadurecemos e nesses últimos três anos, não teve uma vez sequer que ele viesse por aqui que não desse um jeito de nos ver. Nesse último fim de ano, a visita dele foi bem especial. Ele passou lá em casa numa noite e, dessa vez, ficou claro que estava sem nenhuma pressa pra ir embora. Sentei do lado dele como há muito tempo não fazia e, por diversas vezes, olhei pra ele, sorri e falei que estava muito feliz por vê-lo.

Na última segunda feira, comecei o dia com minha sessão de terapia. Espontaneamente, passei a sessão inteira contando essa história pra minha psicóloga. As lembranças ficaram vívidas em minha memória ao longo de todo o dia. À noite, Fabinho me deu a notícia triste quando chegou em casa.

Essa vida é estranha.

10 comentários:

Eittanoise disse...

oi Maíra, relato emocionante de uma relãção linda de amizade desses SNOOZERS.Tenho grande amizade por todos vcs da familia.Rafael Jr e Fabinhos serão sempre "os amigos que aprendiz a gostar" por cartas.Nos encontramos pouco, mas o carinho que tenho por todos vcs me faz entender melhor a dor que vcs estão passando.Já perdi um grande amigo tragicamente e nunca deixo de pensar "como tudo isso é estranho".Abração

Rafael Jr disse...

Muito legal, Má!
O que curti mais, tanto no seu texto quanto no de Adolfo, é que não pintam um cara "perfeito" só porque se foi. Os "defeitos" (digo defeitos porque as vezes reclamávamos desse jeito de ser) dele tb estão retratados, e o amávamos assim, até porque as qualidades eram MUITO superiores!
Beijão.

Marcelinho Hora disse...

Como foi importante a década de 90.Achei amigos, parceiros, irmãos, que guardo até hoje:Daniel, Rafael, Fabinho, Lalo, Carlinhos, Gilberto, André Tunes(Rato)e tantos outros...Época de Mahalo, Tequila e Capitão Cook...Snooze, Ângelus Novus...Lembrei-me agora de um show da Snooze no Mahalo...kkkkkkk...chegou a hora da Snooze se apresentar e onde estava Daniel? Em casa, de pijama, como se nada estivesse acontecendo...simples assim...simples como ele era!Passamos lá, ele entrou no carro, partimos às pressas para o show...Usou minha guitarra e tudo mais...Nunca vou me esquecer daquele dia! E que puta show!!!!A química dos 3 e a saudade daqueles dias será sempre eterna! Bjo, Má!

MeuSons disse...

e tua acha que ele morreu?! pessoas boas sempre vivem. talvez esse seja o melhor conceito sobre a vida: é o ser. eu sou, tu és, ele é. no final nós somos...
bela lembrança.

Unknown disse...

Maíra, adorei o seu relato. Só não sei se era verdade que te detestamos naquela época. É claro que a ausência dele era sentida. Mas, eu tinha mesmo era muita curiosidade. Te achava uma garota audaciosa, destemida, que vivia intensamente a aventura da vida. Pena mesmo é que nunca tivemos tempo. É claro que a admiração continua, viu? Quanto ao nosso Daniel...não há palavras para expressar o quanto é dolorido não recebermos o sorriso e aquele olhar! Bjs

Maíra disse...

A todos que comentaram e compartilharam esse sentimento, obrigada.
Como já falei várias vezes, me fez bem escrever esse texto e eternizar essas memórias.

Agatha querida, a admiração é mútua, pode ter certeza. Talvez a palavra tenha sido equivocada, mas sei que morriam de ciume de nós. :)
Coisa de gente jovem. Ainda bem que a gente cresce.

Danizinha disse...

Lendo seu relato, passou aquele filme na minha frente. Ai que tempo bom, e que saudade!
Por aqui tudo é ímpar, bom mesmo é que curtimos a todo vapor. Um dia a gente se vê, com toda certeza. Deus é generoso demais. Agradeço por ter compartilhado de momentos tão legais com Daniel, vc e Fabinho.Sem lamentaçãoes.

Wikimetal disse...

Amigos,

Segue o texto que mandei pra família do Daniel Garcia:
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Pouca gente conhece esta história.

Em 1999 abrimos uma de nossas primeiras vagas para contratação na Kaizen. Era uma vaga de estágio.

Dois candidatos se inscreveram. Seriam entrevistados por mim e pelo Marcio.

O 1º candidato entrou. Era o Daniel Garcia. A entrevista durou uns 15 minutos.

Quando o Garcia saiu da sala, antes do 2º candidato entrar, o Marcio e eu dissemos um ao outro, quase ao mesmo tempo: “O próximo candidato terá que ser MUITO, MUITO, MUITO bom pra conseguir tirar a vaga do Daniel Garcia”.

Não era. Aliás, pouquíssimos são.

Esse foi o dia e a maneira como eu conheci o Daniel Garcia:
Numa entrevista de 15 minutos.

Daquele dia em diante, foram 11 anos que convivemos de perto, e eu pude perceber que era assim mesmo:

15 minutos eram mais do que suficientes para que qualquer pessoa pudesse perceber como o Daniel Garcia era: Um cara inteligente, capaz, dedicado, bem-humorado, leal, comprometido, estudioso, simpático, mas acima de tudo:

Bom. Uma pessoa boa. Uma pessoa do bem. Alguém que só fez amigos. Alguém que se tornou um dos pilares da Kaizen. Alguém que pra mim é um exemplo a ser seguido.
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O meu sócio (Marcio, atual Presidente da Kaizen) escreveu para a família do Daniel Garcia a seguinte mensagem que segue no post logo abaixo:

Wikimetal disse...

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O Daniel Garcia foi um profissional fundamental na história de nossa empresa.

Participou de momentos decisivos, e eu o considero uma das pessoas mais brilhantes e inteligentes que já conheci. Sua capacidade de explicar coisas complicadas, e de enxergar além do muro, sempre me impressionaram.

Participou da criação de uma área que inicialmente chamamos de “Soluções de Negócios”, e foi peça chave pra transformar o que hoje é nossa linha de serviços mais lucrativa.

Recentemente ele estava alocado à área de consultoria, que é o nosso mais novo foco de desenvolvimento de negócios. Mais uma vez, colocávamos o seu filho na ponta de lança, pra participar de algo novo, que estávamos criando. Afinal, isso é o natural, não é? Colocarmos as pessoas de nossa mais alta confiança nas posições que precisamos delas. E seu filho nunca nos desapontou.

Poucas pessoas sintetizavam tão bem quanto ele o espírito de coleguismo, profissionalismo, dedicação, amizade e respeito que procuramos manter em nossa empresa.

Eu poderia escrever um livro sobre os feitos profissionais de seu filho nesses mais de 10 anos.

Mas isso seria apenas uma parte da história.

Garcia era um grande amigo. De todos.

A imagem que me vem à cabeça agora, quando me lembro dele, é sempre com um sorriso largo no rosto. Como eu gostava e admirava aquele sorriso... Como ele iluminava a todos que o cercavam...

Não tive a oportunidade de conhecê-los, mas quero que saibam que eu também os admiro. Uma pessoa como o Garcia, só pode ter sido educada de forma sólida, rica nos principais valores do ser humano, que nosso mundo tanto precisa.

Parabéns pelo filho que vocês criaram, tenham certeza que foi alguém que fez a diferença no mundo, e que deixou um legado por onde passou.

Abaixo texto que enviei para todos os funcionários da empresa:

“Staff
O dia mais triste da nossa história.

Ontem perdi um grande amigo, um colega de trabalho, um exemplo de profissional, a pessoa mais doce que já conheci. O sorriso mais fácil e largo, sempre disponível, à espera de qualquer coisa pra se mostrar e iluminar nosso dia

Queria poder escrever palavras reconfortantes e encorajadoras pra Família Kaizen, mas sinceramente não consigo agora. Sinto-me como o irmão mais velho que perdeu aquele caçula ilustre, o mais inteligente da família. Alguém que você tinha sonhado uma carreira e vida brilhantes, alguém com quem você sonhava passar o resto de sua vida junto. Só pra poder estar perto da energia daquele sorriso e desfrutar da sua companhia.
Pedi para prepararem uma caixa, onde colocaremos homenagens e lembranças, pra serem enviadas a família dele. Quem quiser preparar algo pra ser enviado junto, peço que levem ao velório.
Descanse em paz meu grande amigo, meu irmão. Que a gente consiga viver a vida dignos de sermos lembrados como sua família.”

É como eu me sinto, como o irmão mais velho que perdeu o caçula ilustre. Não me lembro de ter sentido tanto a perda de alguém como estou sentindo do Garcia.

Saibam que aqui ele também deixou uma família imensa em luto.
Sentiremos infinitas saudades de seu filho.

Que Deus abençoe a todos nós.
Marcio.
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Bem... Pra terminar, como escrevo num site de Heavy Metal, montei um texto que dediquei a todos que conheceram o Daniel Garcia.

Então, obviamente o texto é pra vocês também.

http://www.arenaheavy.com.br/index.php?pagina=771

Um grande abraço a todos vocês,
Daniel Dystyler.
(comecei o texto com "Amigos" pois mesmo sem conhecer vocês, só pelo que escreveram sobre o Daniel Garcia, já dá pra considerar meux amigos)

JAN DE LONAN disse...

Fiquei sabendo através de um vizinho dele daqui.Fiquei abalado. Não entendi patavinas. Saudades eternas de Peter Parker!